sexta-feira, 28 de janeiro de 2011
Capitalismo cruel
terça-feira, 18 de janeiro de 2011
As crianças de Lombok
Saímos de Bali e viemos à ilha vizinha: Lombok. Diferente de Bali, Lombok é muçulmana. A lingua predominante aqui não é o Indonesiano (ou Bahasa Indonesia), mas o Lomboquês (ou Bahasa Sasak).
Lombok é incrível em vários aspectos: praias paradisíacas de areia branca fina, coqueiros, e bem rural (ao menos no Sul, onde estamos, Kuta Lombok). No caminho pras praias de surfe, agora de motinho pelas ruas esburacadas, a gente passa por casebres que não devem ter nem luz elétrica, com suas cabras, galinhas, vacas...
Eu pensei que não fosse ter nem internet aqui (pois, como já tinham nos informado, não tem caixa eletrônico, por exemplo), mas na vilinha onde ficam as acomodações já tem internet broadband! Ou seja, se tem algo que Lombok tem em comum com Bali é o contraste. De um dos lados do lixo acumulado em terrenos baldios, vê-se cabras e crianças brincando; do outro, placas de imobiliárias vendendo terras já loteadas ou propaganda de resorts.
Falando nas crianças, é nelas que eu quero me deter neste post. Passou da 1h da tarde, hora em que elas saem da escola, tu colocas o pé na rua e vêm várias tentar te vender pulseirinhas. Elas são fofas, de 4 ou 5 anos de idade a uns 12, e falam inglês! Normalmente elas estão em pequenos grupos, e tem uma que domina mais o idioma. Aí sempre rola um papo, é claro! Elas perguntam o teu nome, te dizem “nice to meet you”, te perguntam de onde és!
Hoje uma menina, de nome Fika, quando estávamos no restaurante, veio sozinha. Aproveitou uma brechinha do dono, que não deixa elas entrarem e “incomodarem” os clientes, e veio direto pra nossa mesa. Ela se apresentou, perguntou nosso nome, nos deu um aperto de mão. Gente, muito linda ela! Eu a elogiei, é claro, e ela disse que eu também era beautiful; depois elogiou meus brincos (em formato de flor, produzidos na fábrica do meu primo Alexandre), e eu já tinha me derretido por ela. Mas aí o dono chegou e pediu pra ela sair. Eu decidi que vou comprar uma pulseirinha dela na próxima vez que a encontrar!
Depois, estávamos passeando pelas lojinhas (pequenas casinhas feitas de bambu ao longo da praia onde vendem vestidos, shortinhos, etc.) e um menino de uns dois anos disse “hello, miss!” com um sorriso, enquanto o irmãozinho dele de meses, sentadinho no chão de concreto, abanava.
Num café, enquanto tomávamos uma Bintang, a cerveja daqui, na beira da praia, outras duas meninas se aproximaram, e desta vez era a pequeninha, de uns 4 ou 5 anos, que mandava no inglês. Que pronúncia, que olhar vivo, que fofa ela! Seu nome é Mary e o da irmã, Lisa. Chama a atenção como várias aqui têm nome americano... Já conheci Tina, Anne, Julianne...
E agora há pouco, para completar, estávamos sentados tomando um cafezinho na varanda da nossa acomodação – uma homestay, que é das acomodações mais baratas por aqui –, três meninos entraram e vieram ter com a gente. Umas figuras eles! Principalmente o dominante. Todo estiloso, cabelo arrepiado com gel (ou algo equivalente), um sorrisão! Nos ensinaram umas palavras de Lomboquês: como dizer “não, obrigada”, “amanhã”, “não tenho dinheiro”... E repetiam até que a gente falasse certinho! Na real, quando eles estavam entrando eu pensei: “até aqui?!! Bem na hora do cafezinho...!”. Mas no fim o papo foi ótimo! Eu sempre pergunto se eles vão à escola, e até hoje, que é sábado, eles foram; seis dias de escola na semana (amanhã é dia de feira, nos explicaram). Aliás, é na escola que eles aprendem inglês, além do Indonesiano e do Lomboquês, por certo. Nos disseram, bem orgulhosos, que falam três linguas!
Ele (esse acabei esquecendo de perguntar o nome; ele também o nosso) falou que gostou da nossa música (era o grupo espanhol Café Quijano), perguntou quanto eu paguei no Ipod (sem usar a palavra Ipod), eu respondi que foi presente da minha mãe, disse então que achou very nice e que adora cantar. Parei a música e pedimos: canta pra gente! Ele pensou um segundo, buscando a palavra, e disse apenas: shy!
Que encanto essas crianças! Sério, eu tenho vontade de comprar uma pulseirinha de cada uma delas! Me dá uma pena de elas estarem trabalhando... Aí o Decarlos diz que a situação das crianças pobres no Brasil é bem pior, que ao menos aqui elas não estão pedindo esmola no sinal ou tentando conseguir dinheiro pra manter o vício dos pais... que o dinheiro vai pra comprar livro pra escola, como elas dizem, ou pro sustento da família, e que elas não estão num trabalho pesado, numa fazenda ou quebrando pedra, como já saiu na tevê... Mas mesmo assim me dói. Elas tinham que estar brincando, curtindo a vida... mas a vida não permite...
Bom, esse foi só o nosso primeiro dia aqui. Se continuar assim, amigas, preparem-se: vai ser pulseirinha de Lombok de lembrança pra todo mundo!
segunda-feira, 3 de janeiro de 2011
Bali dos contrastes
Mas eu quero falar mesmo é dos papos que batemos com os motoristas de táxi. Pra começar, os indonesianos em geral falam pouco ou nada de inglês! Mesmo aqui em Bali, lugar tão turístico, às vezes é difícil se fazer entender. Ou seja, os motoristas de táxi, apesar de falarem pouco inglês, são os que melhor falam!
O trânsito aqui é muito louco: motocicletas, carros, pedestres, bikes, todos se misturam, passam fino um do outro, e pros locais tudo parece absolutamente normal, enquanto a gente, dentro dos táxis, no começo em alguns momentos perde a respiração! Agora, entre Natal e Ano Novo, tem muuuita gente e muito veículo na rua, então alugar carro ou motinho por enquanto nem pensar! Eu não me arrisco! Por isso táxi é a melhor opção. Pegamos tanto na nossa chegada, em Jakarta, quanto aqui em Bali pra ir de um lugar a outro. E no fim é uma ótima oportunidade pra conversar com gente daqui!
Hoje de manhã pegamos (eu, Decarlos, Ângela e Camilo, nossos amigos de Wellington que estão por aqui!) um pra ir de Nusa Dua a Sanur, onde passaremos a virada. De cara, o motorista, o Dira, nos chamou a atenção: não era um balinês tão calmo quanto os que vimos por aí. Mas como todo balinês, gosta de conversar e é simpático e risonho! Aproveitamos e enchemos o cara de pergunta!
Do nosso papo duas coisas me chamaram mais atenção. Uma é a dureza em que ele vive. Negociamos o preço da viagem e ele apareceu com um carrão. Claro que não era dele, mas do “boss”, um chinês. E ele estava nos falando que só 20% do que pagamos fica com ele. Ele mora numa casa de um quarto (se é que a casa em si não é uma peça apenas), e ele dorme na mesma cama com a esposa, o filho de 9 anos e a filha de 5. Paga 300.000 rúpias por mês (mais ou menos US$33,00). Na negociação, ele começou dizendo que normalmente esta viagem de Nusa Dua a Sanur custa $150.000 rúpias, mas como tinha trânsito ele teria que cobrar 200.000 da gente. Nem tentamos negociar. A pobreza contrasta tanto com a riqueza dos resorts na beira da praia aqui que eu nem tenho mais vontade de barganhar quando estou lidando com locais; quero mais é pagar o que eles pedem. Digo isso porque há um quase “desespero” por parte dos locais de conseguir gente pra sua lojinha, pro seu transporte, pro seu restaurante, que me dói. Enfim, o que eu ia dizer é que eu espero que ele repasse apenas 150.000 pro “boss” dele, e que fique com os 60.000 extras (demos mais 10.000 de gorjeta) pra ele e pra família. Mas como eles parecem ser honestos, fico até na dúvida!
Outra coisa que me chamou a atenção é a raiva que ele tem de muçulmanos, ele que vive no país muçulmano mais populoso do mundo (embora todo país árabe seja muçulmano, nem todo país muçulmano é árabe)! Sim, a ilha de Bali é de maioria hindu e agora nas férias vem muita gente da ilha de Java pra cá, todos muçulmanos, e o Dira deixou bem claro, mesmo no seu parco inglês, que não gosta nem um pouco deles, que eles brigam muito, que colocaram as bombas em Bali nos anos de 2002 e 2005, que não tem nada contra os chineses e os cristãos, mas que preferia que os muçulmanos não viessem pra cá.
Aí que esse papo todo me fez pensar várias coisas. Primeiro, referente à minha primeira observação – o contraste entre pobres e ricos, a exploração dos pobres – pensei que talvez nisso Indonésia e Brasil não difiram muito. Mas apesar desta minha constatação, hoje, meu segundo dia aqui, me senti triste com a pobreza, com o lixo na rua, com a injustiça do mundo... eu que sou do Brasil, outro país de contrastes...
Já no quesito religião, pensei que o Brasil tem isso de bom: tolerância religiosa! Com toda a variedade de religiões que temos no nosso país, conflitos ou desacordos violentos entre diferentes na crença não é um dos nossos problemas. Aqui na Indonésia e em outros países do Sudeste Asiático, é um item constante nos relatórios de direitos humanos de ONGs como a Human Rights Watch ou Anistia Internacional. No caso específico da Indonésia, a questão envolve restrições que o governo impõe a atividades religiosas que não condizem com os mandatos das seis religiões oficiais do país (Islamismo, Protestantismo, Catolicismo, Hinduísmo, Budismo e Confucionismo).
Aí depois eu fiquei pensando na questão dos muçulmanos. O “mundo muçulmano” é enorme e variado! Então tem-se que tomar muito cuidado com as generalizações. Mas quando muçulmanos radicais e intolerantes têm atitudes radicais e intolerantes, é muito fácil cair na generalização e falar que “os muçulmanos são isso ou aquilo”, “são violentos e terroristas”, etc. E eu acho que ao fazer este tipo de afirmação comete-se uma injustiça com a maioria dos muçulmanos... Eu atribuo parte disso à mídia, às notícias que nos chegam, mas no caso do Dira, o motorista do táxi, não sei se a mídia está envolvida... Tenho a impressão que é mais questão de experiência pessoal... E então lamento essa rixa, pra falar de forma leve, entre hindus e muçulmanos que há em alguns países do Sudeste Asiático...
De fato, Indonésia é um país bastante religioso e Bali mostra bem isso. Todos os dias os balineses colocam uma oferenda para os deuses na frente das suas casas ou lojas; to-dos-os-di-as! São florzinhas, algum pedaço de comida (já vi bolachinha, fruta, arroz) e até cigarro! Nos explicaram que é pra trazer boa sorte! E boa sorte é o que eu desejo a este país dos contrastes na resolução de seus conflitos! Selamat Tahun Baru (Feliz Ano Novo) pra Indonésia e pra todos nós!
P.S. Só pra esclarecer, depois do Dira pegamos vários outros táxis e nenhum dos motoristas tinha raiva de muçulmano! Bem que a gente logo notou que o Dira era um balinês mais nervoso, como eu disse antes. E mesmo os conflitos ligados a intolerância religiosa aqui ocorrem em partes específicas da Indonésia. Bali é uma ilha pacífica, linda, interessante e, sim, de contrastes! (em 7/1/2011)